sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

O espaço da vanguarda

Um velho porão localizado na Rua Teodoro Sampaio, no bairro de Pinheiros, agitou a cena cultural da cidade de São Paulo na primeira metade da década de 1980. Espaço de vanguarda e efervescência cultural, o teatro Lira Paulistana era ao mesmo tempo palco para música, teatro, cinema, artes plásticas, literatura e jornalismo. Por ali passaram nomes como Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção, Tetê Espíndola, Suzana Salles, Cida Moreira, Laura Finocchiaro, os grupos Rumo (com Ná Ozzetti e Paulo Tatit), Língua de Trapo, Premeditando o Breque, Ultraje a Rigor, entre outros artistas que protagonizaram um dos mais estimulantes movimentos culturais experimentados pela capital paulista, a chamada "vanguarda paulistana".


O genial Itamar Assumpção canta "Prezadíssimos ouvintes", dele e de Domingos Pellegrini

Infelizmente, não cheguei a freqüentar o Lira Paulistana. Mas o professor de literatura do cursinho pré-vestibular do instituto politécnico, onde eu estudava, chamou minha atenção para os grupos Premeditando o Breque e Língua de Trapo. Ele assistiu a um show deles no Centro Cultural Vergueiro e tinha adorado o que considerava ser uma "nova proposta" dentro da música brasileira. Fui conferir e por um bom tempo acompanhei a trajetória desses grupos. Tanto o Premeditando o Breque, posteriormente batizado Premê, quanto o Língua de Trapo, misturavam música e humor, tudo com muita irreverência. O Premê era musicalmente bem mais refinado, já o Língua adotava uma linha mais escrachada. Na verdade, ambos são legítimos herdeiros do grande Adoniran Barbosa e do lendário grupo Joelho de Porco.


Como não encontrei nenhum vídeo bom do Premê, segue este recente em que os ótimos Mário Manga e Wandy Doratiotto cantam "Brigando na lua", samba-de-breque que conquistou o segundo lugar no 1º Festival Universitário de Música Popular Brasileira, realizado em 1979.

Mesmo não tendo ido ao Lira, curti muito a maioria daqueles artistas em disco. Aliás, o Lira Paulistana era também um selo, a partir do qual muitos dos artistas que se apresentavam no teatro tiveram a oportunidade de estrear em disco de forma independente. Lançar um LP por uma gravadora comercial e distribuir o disco no mercado estava fora de cogitação para aquele povo, que fazia um trabalho tão original quanto distante dos interesses da indústria fonográfica. Mais tarde tive um contato pessoal com a Ná Ozzetti em uma festa na casa de um amigo em comum. O saudoso Plínio Chaves tinha sido sócio do Lira. Foi também um dos primeiros a incentivar a carreira solo desta que é uma das melhores cantoras do país, tanto pelo timbre da voz quanto pela técnica apurada. Não consegui trocar muitas palavras com ela. Além da Ná ser, à época, muito tímida, naquela noite comi um bolo cuja receita levava um ingrediente que eu nunca tinha experimentado antes. O troço bateu tão forte que passei a maior parte da festa dormindo no chão da sala.


Neste vídeo, vemos uma interessante fusão de um trecho de uma apresentação do Grupo Rumo em 1984 com outra feita 20 anos mais tarde. A música é a "Falta alguma coisa", de Zécarlos Ribeiro, com destaque para a voz impecável de Ná Ozzetti. 

Nota: o primeiro bloco deste texto foi extraído do Catraca Livre, da Folha online

4 comentários:

Vivica disse...

Curti o Brigando-na-lua!! :D
E esse bolo que tu comeu, pelo menos era de chocolate?? rssrsrs

Beijos e bom começo de semana.

Marcelo Amorim disse...

Nem lembro do que era aquilo, Vivi, nem lembro...rs
Se um dia você tiver a oportunidade de assistir um show do Premê não perde, eles ainda se apresentam de vez em quando. Os caras são bons demais. Beijo

Anônimo disse...

Oi, Ma, que legal encontrar esses seus posts sobre o saudoso e legendário Lira. Há poucos meses teve um festão aqui, na Benedito Calixto, em frente ao extinto Lira, em comemoração aos 30 anos. Puxa,todo mundo veio. As bandas todas, com alguns desfalques, mas ao mesmo tempo "inteiras". A Ná, menos tímida já...rsrs Eu frequentei muito, na época da facu e até antes. Eu era dura e o Lira ou era de graça ou bem baratinho...e de boa qualdiade rsrsr Ideal!
Beijão pra você. E vê se para de me provocar saudades de tudo...rsrsr...
Mara Regina

Marcelo Amorim disse...

Legal foi você ter vindo aqui, Mara. E mais legal ainda foi ter confessado que frequentou o Lira "até antes da facu". Depois fala que eu é que sou velho :-)
Eu não sabia da comemoração dos 30 anos, soube só quando fui pesquisar pra escrever o post. Deve ter sido uma delícia a festa e os shows. Aquela moçada fazia e ainda faz grande parte do que há de melhor na música paulistana. Beijo pra você!