sábado, 28 de agosto de 2010

Rita Lee hoje

Rita Lee, em foto sem crédito

Daqui a pouco vou assistir a Rita Lee, que vem a Fortaleza para uma única apresentação do show "Etc...". Vai ser bem aqui perto, num espaço chamado Siará Hall. Será a segunda vez que verei a Rita num palco. A primeira faz muito tempo, foi num show ao ar livre no Parque do Ibirapuera, numa comemoração de aniversário da cidade de São Paulo. Ela, Paulinho da Viola e Caetano Veloso, ficaram entretendo a enorme plateia até que João Gilberto - com duas horas de atraso - chegou na condição de atração principal. Um show da Rita é garantia de diversão. E de algumas músicas muito boas
 e bastante conhecidas, já que ao contrário da maioria dos artistas, ela não se importa de cantar seus maiores sucessos, embora continue fazendo músicas novas.


Rita Lee e Milton Nascimento, num grande momento, cantam "Mania de você", de Rita e Roberto de Carvalho.


Um trecho do show de sábado, postado no youtube pelo TV Divirta-Ce. A acústica do Siará Hall é péssima, mas Rita Lee e sua banda, capitaneada por Roberto de Carvalho, mandaram muitíssimo bem




quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O Dragão do Mar e o Almirante Negro

O cearense Francisco José do Nacimento, o "Dragão do Mar".

Fortaleza possui um centro cultural muito bonito, com progamação intensa de teatro, shows, dança, exposições e cinema. O nome do espaço é Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, e é alusivo a Francisco José do Nascimento, cearense nascido em Canoa Quebrada, em 1839. Negro e alfabetizado apenas ao 20 anos de idade, Fracisco era filho de pescador e chegou a líder dos jangadeiros de Fortaleza, que desde aquela época atracavam suas jangadas na enseada do Mucuripe, bem onde estou hospedado. Foi nomeado prático da Capitania dos Portos, quando envolveu-se na luta abolicionista. Era o ano de 1881, e Francisco José liderou um movimento praieiro que fechou o Porto de Fortaleza ao tráfico de escravos, sendo por isso exonerado do seu cargo.


O gaúcho João Cândido, o "Almirante Negro", naquela que talvez seja sua última aparição em foto

Quando em 1884 o Ceará aboliu a escravatura - portanto, 5 anos antes da Lei Áurea - Francisco, que ficou conhecido como "Dragão do Mar", foi reconduzido ao cargo e promovido a Major, sendo até hoje considerado o maior herói popular do abolicionismo no Ceará. Nesse mesmo ano de 1884, ele colocou sua jangada dentro de um navio negreiro e foi com ela até o Rio de Janeiro. O herói cearense precedeu outro, também do mar e também negro, o marinheiro gaúcho radicado no Rio de Janeiro João Cândido. João Cândido era conhecido como "Almirante Negro". Liderou a Revolta das Chibatas, movimento ocorrido em novembro de 1910, quando marinheiros - quase todos negros e comandados por brancos - se opuseram aos castigos corporais que ainda eram aplicados na Marinha. Ao contrário de Francisco José, a luta de João Cândido não terminou nada bem para os revoltosos. João Cândido foi discriminado e perseguido pela Marinha até o final de sua vida, que terminou em 1969, ele com câncer, pobre e esquecido, aos 89 anos de idade. Foi anistiado postumamente apenas em 2008.


O mesmo João Cândido, em uma foto mais próxima da época em que liderou a Revolta da Chibata

Cruzando as histórias do "Dragão do Mar" e do "Almirante Negro", acho que finalmente passei a entender a citação que Aldir Blanc faz no belíssimo samba "O mestre-sala dos mares", composto em parceria com João Bosco. O samba começa exatamente com a frase "Há muito tempo nas águas da Guanabara, o Dragão do Mar reapareceu". Tomando isso como verdadeiro, para Aldir, João Cândido seria uma espécie de "reencarnação" do cearense Francisco José, não no sentido físico, mas na bravura e idealismo. Poeticamente, Aldir pode ter unido esses dois heróis em uma mesma música. Encontrei uma entrevista com o Aldir onde ele não menciona em nenhum momento isso que estou supondo. Mas me parece inteiramente possível essa hipótese. Depois disso, gosto ainda mais deste samba.



Elis Regina canta "O mestre-sala dos mares", de João Bosco e Aldir Blanc. A censura militar não permitiu que a letra mencionasse o termo "Almirante Negro", alegando que a Marinha brasileira nunca teve um almirante "de cor". Aldir, então, mudou a letra para "navegante negro", e assim ficou.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Dois cearenses e uma casa

Localizada no que hoje é o centro de Quixeramobim, esta casa, cuja parte da frente era um armazém, foi local de nascimento dos dois personagens mais ilustres desta cidade do sertão cearense. E com uma diferença de mais de 100 anos entre um nascimento e outro.

Adoro mapas. Tendo vários mapas do Ceará colados na parede da sala em que estou trabalhando, é natural que, vez ou outra, eu me pegue percorrendo o estado com os olhos da imaginação. Não saí de Fortaleza, e dificilmente conseguirei fazer isso. Uma pena, pois gostaria de conhecer algumas regiões, especialmente aquela conhecida como Sertão Central, que tem Quixeramobim como uma de suas principais cidades. Pois hoje, fazendo meu tour costumeiro, alguns nomes de cidades começaram a me trazer a lembrança de uma página da história brasileira que sempe me atraiu muito: a Guerra de Canudos. Para você ter uma ideia, no início da década de 1990 percorri sozinho a região do conflito, pesquisando, visitando cidades, arraiais, sítios arqueológicos, conversando com filhos de "conselheiristas" mortos na guerra, lendo relatos originais, fotografando ruínas. Tornei-me um conhecedor do assunto, fui até entrevistado pela revista Superinteressante para falar sobre o assunto. Também cheguei a participar - embora rapidamente - de uma espécie de confraria que havia em São Paulo reunindo estudiosos do escritor Euclides da Cunha. Porém, há muito tempo não retomo esse tema, embora o interesse permaneça sempre vivo em mim.

O corpo de Antonio Conselheiro, fotografado momentos antes de ser decapitado

Corri pesquisar e as lembranças se justificaram. Antonio Conselheiro, líder do Arraial de Canudos, é cearense. Nasceu em Quixeramobim, então um povoado paupérrimo encravado num sertão que não inspirava futuro a ninguém. De lá, ele se deslocou para outros povoados do estado. Chegou a ser professor em Sobral, hoje uma das principais cidades do Ceará, até adentrar o sertão baiano e fundar a vila do Bello Monte, às margens do rio Vaza-barris. Não vou me alongar na história, sob pena de me empolgar e me demorar demais. Mas o que foi ainda mais interessante foi descobrir que na mesma casa onde nasceu Antonio Conselheiro, cujo nome de batismo era Antonio Vicente Mendes Maciel, nasceu também o letrista e arquiteto Fausto Nilo. A casa é hoje o "Memorial Antonio Conselheiro", e é tombada pelo patrimônio histórico do Ceará. Na fachada praticamente original (vide acima), duas placas: uma alusiva ao Conselheiro, outra ao compositor.


Nesta foto sem crédito, o vilarejo chamado de Canudos Velho, com uma estátua de Antonio Conselheiro em destaque. Ao fundo, lá embaixo, o açude de Cocorobó, construído pelos militares em 1969, na tentativa de sepultar o palco de uma das mais tristes páginas da história do nosso país

Fausto Nilo é parceiro de vários artistas de nome, como Fagner, Dominguinhos e Moraes Moreira, e possui músicas gravadas por Elba Ramalho, Luiz Gonzaga, Simone, Gal Costa, Ney Matogrosso e muitos outros. Dias atrás, encontrei num jornal local uma página inteira dedicada a uma entrevista com o Fausto Nilo, onde, para a minha surpresa, não havia uma linha sequer mencionando o letrista, apenas o arquiteto, sinal do quanto ele é respeitado aqui também como tal. Outro fato interessante: Fausto Nilo não só nasceu na mesma casa em que Antonio Conselheiro veio ao mundo, como seu pai usava a casa para um comércio, coisa que o pai do Conselheiro também fazia, lá na primeira metade de 1800. Para alguém que é, como eu, um entusiasta da Guerra de Canudos e da MPB, essa história foi uma descoberta e tanto.



Fausto Nilo canta com extrema delicadeza um dos seus maiores sucessos, composto em parceria com Moraes Moreira, "Meninas do Brasl"